Informativo

Socesp defende manutenção de IECA e BRA em pacientes hipertensos com covid-19

22/06/2020

As sociedades de cardiologia internacionais têm divulgado recomendações contrárias à descontinuação do uso de inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA) e bloqueadores de receptores da angiotensina (BRA) em pacientes hipertensos diagnosticados com covid-19 (sigla do inglês, Coronavirus Disease 2019) [1,2] devido ao risco de descompensação clínica.

O posicionamento das sociedades médicas ocorreu após a publicação de estudos que sugeriam que esses fármacos poderiam estar associados a pior desfecho clínico [3] em pacientes com SARS-CoV-2 (sigla do inglês, Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2). A Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp) está alinhada a essas entidades, e também recomenda a manutenção do tratamento com inibidores de ECA e BRA. [4]

Em entrevista ao Medscape, o médico cardiologista Dr. Luciano Drager, que é diretor científico da Socesp, defendeu que, no momento, não há evidências suficientes que demonstrem que o uso de inibidores de ECA e BRA pode aumentar o risco de agravamento clínico de pacientes com covid-19.

"Observamos muita confusão inicial no entendimento de como o coronavírus entra na célula (via receptor da ECA 2 localizado na membrana celular) com os mecanismos de ação de inibidores de ECA e BRA. Embora alguns estudos experimentais e observações iniciais tenham colocado em discussão a segurança do uso de inibidores de ECA e BRA neste cenário, um crescente número de ensaios clínicos observacionais não sugere risco de aumento da suscetibilidade de contaminação pelo novo coronavírus ou de pior desfecho clínico relacionado com o uso destas importantes classes farmacológicas", afirmou o Dr. Luciano, lembrando que um dos estudos [5] envolvendo 169 hospitais da Ásia, Europa e América do Norte sugere até um efeito protetor dos inibidores da ECA, "mas esse achado ainda necessita da confirmação de estudos randomizados".

Em meio à discussão acerca da segurança do uso desses medicamentos em pacientes com infectados pelo SARS-CoV-2, outra linha passou a ser defendida por alguns especialistas: um caminho alternativo, onde não haveria a descontinuação nem a manutenção do uso de inibidores de ECA e BRA, mas sim a substituição por outros fármacos que mantivessem suas funções nefro e cardioprotetoras, mas sem o suposto risco de agravamento clínico do quadro de covid-19.

A espironolactona, um diurético poupador de potássio, por exemplo, vem sendo citada como um dos medicamentos que poderia substituir os inibidores de ECA e BRA. A hipótese defendida por alguns pesquisadores é que, enquanto os inibidores de ECA e BRA poderiam contribuir para a entrada do SARS-CoV-2 no pulmão, porque promoveriam um aumento da ECA 2 atrelado ao tecido pulmonar, a espironolactona teria efeito contrário, ou seja, poderia proteger o pulmão da entrada do vírus, pois aumentaria a expressão de ECA 2 circulante no plasma. [6]

Para o Dr. Luciano, no entanto, não há qualquer evidência que corrobore a substituição dos inibidores de ECA e BRA por espironolactona.

"Assim como está acontecendo com inúmeros tratamentos aventados para esta pandemia, a boa prática clínica recomenda estudos que respaldem esta conduta", disse o cardiologista, e acrescentou que "a medida pode não ter sentido se os inibidores de ECA e BRA não agregarem nenhum risco como sugerem os grandes estudos observacionais publicados recentemente". [5,7,8]

Diante desse cenário, a Socesp defende a manutenção do uso de inibidores de ECA e BRA e entende que a interrupção da terapia pode até ser prejudicial no contexto de descompensação de comorbidades, por exemplo, hipertensão arterial, insuficiência cardíaca, doença coronariana, doença renal crônica, entre outras.

"Há a necessidade de conclusão deste assunto com estudos randomizados que estão em andamento (alguns em fase final de recrutamento)", ressaltou o Dr. Luciano.